Nunca tivemos, como nos últimos anos, tantas informações, relatos e fatos divulgados pela imprensa sobre comportamentos inadequados de dirigentes e sócios de empresas públicas ou privadas em nosso país. O mesmo tem acontecido na esfera dos três poderes que constituem a República: legislativo, executivo e judiciário.
A primeira conclusão a que podemos chegar é a de que o cinismo tomou conta de boa parte da sociedade brasileira, e as práticas de governança têm sido abandonadas em proveito próprio ou de empresas tanto de grande porte quanto as de médio ou até pequeno porte, que serviram como meio para a prática de atos ilegais, para dizer o mínimo.
Acho que poucos em nosso país têm esperança de que as coisas se acertem no curto ou médio prazo. Outras lições ainda terão de ser aprendidas e continuarão sendo dolorosas. O fato é que os interesses dos dirigentes e sócios das empresas até aqui envolvidas nas diversas investigações do Ministério Público e da Polícia Federal não estiveram alinhadas com as demandas e expectativas das partes interessadas. Você concorda?
Tomando outros exemplos de má governança, e de outra natureza, com efeito em partes interessadas temos:
- O dieselgate da Volkswagen – a empresa foi flagrada com adulteração de resultados de emissões em veículos a diesel no território estadunidense. A EPA – Agência de Proteção Ambiental – aplicou multa equivalente a US$14,7 bilhões! O episódio se deu no final do ano de 2015;
- O acidente ambiental causado pelo rompimento da barragem da Samarco no município mineiro de Mariana, além do desastre e perda de vidas fez com que a empresa esteja com atividades paralisadas desde novembro de 2015 até hoje;
- No final do ano passado mais uma montadora de automóveis – Fiat Chrysler – foi notificada pela EPA nos Estados Unidos da América por infração semelhante à da Volkswagen. As ações da empresa chegaram a perder 18% do valor na Bolsa de Valores de Nova York.
E o que são partes interessadas?
O termo stakeholders, que foi traduzido para o português como “partes interessadas”, passou a ser adotado no mundo dos negócios na década de 1960, na tentativa de identificar pessoas, empresas ou grupos cujo envolvimento formal ou informal com o negócio/firma pudessem ser afetados por estratégias, decisões e ações desencadeadas por esse negócio.
Alguns estudiosos classificam as partes interessadas em aquelas de natureza primária, como proprietários/acionistas, empregados, clientes, fornecedores, concorrentes e secundários, como, por exemplo, a comunidade que fica instalada próxima à atividade empresarial.
Com o avanço da vida em sociedade, a abertura do capital dos empreendimentos, o aperfeiçoamento das leis, a conquista de direitos por minorias, o progresso na comunicação via internet e a imprensa livre, há cada vez mais exigência para que os dirigentes empresariais e também os proprietários das companhias à frente do negócio levem em conta as implicações que decisões tomadas possam ter tanto no curto como no longo prazo em outras partes interessadas.
Não dá para menosprezar as expectativas de pessoas ou grupo delas que se abrigam sob o guarda-chuva de stakeholders. De outra forma, empresas hoje bem sucedidas e lucrativas podem ir à bancarrota por práticas que não se alinham aos interesses de outras partes. Certo?
Aqui falo não só do prejuízo financeiro que a má prática de gestão pode gerar, por erro ou inépcia, com multas e outras penalizações pecuniárias, como também do efeito negativo na reputação do negócio quando a decisão provoca perdas para empregados, acionistas, fornecedores, clientes ou concorrentes, no caso de concorrência predatória.
O dirigente moderno e bem preparado por certo irá sempre desenhar a estratégia do negócio e promover sua execução visando o bem desse sem perder de vista que há outros interesses para se levar em conta.
Com o intuito de aprimorar e sobretudo praticar a boa conduta quanto aos interesses das outras partes, é recomendável às companhias:
- Obedecer rigorosamente às leis que disciplinam a atividade empresarial;
- Que os executivos das diversas áreas do negócio (Vendas, Produção, Qualidade, Meio Ambiente, Recursos Humanos, Tecnologia da Informação, Jurídico, Finanças, Compras…) tenham olhar claro sobre as partes interessadas e ponderem as demandas e expectativas delas e suas implicações nas atividades de suas áreas;
- Construir cultura sustentada em padrões éticos e “vigiada” por código de conduta conhecido por todas pessoas que nela atuam;
- Que não haja tolerância para com práticas de mau comportamento, e aqui os dirigentes são absolutamente responsáveis por impor um padrão ético acima de qualquer suspeita, aplicando punições quando necessário;
- Assegurar que as pessoas contratadas tenham perfil e caráter condizentes com as exigências éticas;
- Prover canal de denúncia para apurar suspeitas de má conduta;
- Que a avaliação de desempenho das pessoas leve em conta tanto o atingimento das metas, como o comportamento no ambiente da firma;
- Ter, dependendo do tamanho e/ou complexidade do negócio, conselho de administração ou consultivo diversificado com membros independentes e capacitados;
- A utilização de ferramentas de controle interno, como auditoria, por exemplo;
- Atuar com total transparência junto à sociedade quanto aos atos praticados e que possam ter implicado em prejuízo a outras partes interessadas;
- Tomar ações imediatas para mitigar/eliminar perdas para as partes interessadas sempre que a situação exigir.
Não é fácil equilibrar os interesses dos dirigentes empresarias com os dos stakeholders, mas, no fim do dia, é o que conta e acaba sendo determinante do sucesso absoluto do negócio, permitindo sua perenidade ao longo do tempo.
Pense nisso!
Revisão de texto: Virgínia De Biase Vicari