Os objetivos da boa prática de governança nas organizações são nobres, e entre eles se destacam: garantir a perpetuidade do empreendimento; gerar valor para acionistas e/ou controladores, e entender e atender aos interesses das diversas partes interessadas (stakeholders).
O encaminhamento correto e ético das atividades da organização, sem descuidar da visão estratégica para assegurar a longevidade desta, exige a construção de cultura consistente e alinhada com estes princípios, além de instrumentos de monitoramento e controle para inibir e/ou evitar transgressões que coloquem em risco o atingimento do propósito da firma.
Segundo o estudo demográfico das empresas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) referente ao ano de 2014, o Brasil possuía 4,6 milhões de empresas ativas gerando ocupação para quase 42 milhões de pessoas, sendo 84% destas assalariadas e as demais sócios e/ou proprietários. A idade média desse grupo de empresas era de 10,6 anos. Pouco, não é?
A edição de Grandes Grupos publicada recentemente pelo Valor Econômico listou os 200 maiores, incluindo os setores: comércio; financeiro; indústria e serviços. Segundo a publicação, esses grandes grupos, que reúnem mais de 4.500 empresas, correspondem a 68,4% do PIB nacional.
Se é possível estabelecer uma relação com dados de fontes diferentes (IBGE x Valor), a conclusão é que pouco menos de 1% das organizações corresponde a quase 2/3 da produção nacional!! Por outro lado, esses números revelam a complexidade e quão grande e disperso é nosso país quanto às atividades econômicas.
Existe, portanto, enorme oportunidade para aperfeiçoar os mecanismos de governança pelo país afora, e desse modo construir empreendimentos sólidos e perenes, contribuindo para uma economia pujante com geração de renda e emprego, além de diminuição das disparidades sociais.
As práticas de governança, ou melhor, as necessidades para adotar as melhores delas passam obrigatoriamente pelo estudo aprofundado das peculiaridades das organizações que compõe esse universo. E essa constatação tem sido levada em conta pelo IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa).
O IBGC publicou em 2014 o caderno de boas práticas das companhias fechadas. Em 2015 foi apresentado ao mercado o caderno de boas práticas de sociedades de economia mista – aquelas que têm como acionista controlador o Estado; e em 2016 foram divulgados dois novos trabalhos: a) caderno de governança da família empresária e b) a quinta edição do código de melhores práticas de governança corporativa, que é bem abrangente, mas com bastante foco e aplicação para empresas de capital aberto.
De modo geral, cada uma dessas publicações busca promover a boa governança, lembrando que este é um tema em constante evolução e deve ser entendido como um processo, fazendo com que a ética, a transparência, o cuidado com o trato de recursos de terceiros, a preocupação com as mudanças do ambiente de negócios e regulações, além de gestão de risco sejam pontos aplicáveis tanto às organizações de capital aberto como às fechadas e ainda às familiares e, sem dúvida, àquelas cujo controlador é o Governo/Estado. Faz sentido, não é?
Gostaria de destacar alguns pontos relevantes para cada tipo de empreendimento, sabendo ser impossível dar espaço a todos a fim de respeitar o tamanho de um texto de blog.
- Sociedade de economia mista: as recentes – aliás, não tão recentes assim –descobertas sobre má gestão (fraudulenta, descuidada na aplicação de recursos financeiros e corrupta) exigiram posicionamento do IBGC para “sugerir” práticas para mitigar a interferência do controlador no dia a dia do empreendimento com objetivo meramente político e criar mecanismos de controle, ainda que constitucionalmente disponhamos de tribunais de conta e outros órgãos de controle;
- Empresa familiar: algumas já passaram ou ainda passam por intenso processo de profissionalismo, o que acaba “empurrando” para melhores práticas de governança, porém, há, em minha visão e também do IBGC, muito espaço para ajustar o verdadeiro papel da família no empreendimento e da necessidade de separar a gestão da propriedade e alinhamento dos propósitos e valores familiares;
- Empresa de capital fechado: é importante aqui criar mecanismos que otimizem o valor do negócio por meio de gestão profissional e disposta a utilizar ferramentas modernas, cuidando também das pessoas, de planos de sucessão formal e da mitigação dos conflitos de interesse;
- Empresa de capital aberto: aqui diversos órgãos, como a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e BM&F (Bolsa de Valores) também contribuem com exigências para o devido enquadramento das empresas em práticas que gerem valor, ao mesmo tempo em que protegem o acionista minoritário e outras partes interessadas. Importante destacar a relevância na divulgação de dados e informações ao mercado e da constituição de quadro de conselheiros de administração de alto nível e independente, entre muitas outras questões.
Sem dúvida, temos em nosso país uma longa estrada a percorrer no sentido de sedimentar as boas práticas de governança e assim propiciar imensa contribuição no desenvolvimento econômico e social brasileiro. Sempre tomando o cuidado, no entanto, com as peculiaridades da firma/organização.