Para quem o negócio gera valor? A representatividade dos governos

Há uma queixa generalizada – de muitas décadas – de que a carga tributária no Brasil é excessiva e penaliza a todos: famílias e empresas. E ainda pior é a percepção de que o volume de recursos arrecadados pelos governos – federal, estadual e municipal – não se reverte em benefícios na mesma proporção. Isso é consenso.

Segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), em 2015 nosso país ocupava a décima quarta posição na relação carga tributária/PIB com 33%, ou seja, um terço da riqueza gerada pelos brasileiros era destinado aos cofres públicos. É importante lembrar que à frente do Brasil estavam economias de primeiro mundo, como Dinamarca, França, Itália, Alemanha, cuja qualidade de vida de longe é superior a dos brasileiros. Por outro lado, nosso país superou em muito a média da relação carga tributária/PIB dos países da América Latina e Caribe, que foi de 21,7%. Também ficamos acima dos Estados Unidos (26%), da Coreia (24,6%) e da Turquia (28,7%).

Não há dúvida de que a arrecadação de impostos e taxas no Brasil, em todos os níveis de governo, é fator de desequilíbrio na economia e, proporcionalmente, não beneficia a população em geral no nível desejado e necessário.

Alguns outros dados sobre a carga tributária brasileira (impostos e taxas):

  • Cerca de 68% da arrecadação está em mãos do Governo Federal, sendo os Estados responsáveis por 25%, e finalmente os municípios com 7% do total coletado;
  • 50% dos tributos e taxas recolhidos aos cofres públicos são originários das transações com bens e serviços, enquanto 26% são impostos incidentes sobre a folha de salários e 18% sobre renda;
  • Entre os valores arrecadados pelo Governo Federal, 27,2% são oriundos da Previdência Social, enquanto o imposto de renda corresponde a 26% do total, e a seguir estão a “dupla” PIS/Cofins com 19,7% e o IPI com 3,2%;
  • Nos Estados, a maior porção arrecadada corresponde ao ICMS, que somou, em 2015, 396 bilhões e 500 milhões de reais, representando quase 21% de toda a carga tributária nacional;
  • Os municípios têm como maiores fontes de renda o ISS e o IPTU. Esses dois somados corresponderam, em 2015, a quase 5% do total arrecadado no país na forma de impostos e taxas.

Esses dados indicam que todos – pessoas físicas e jurídicas – destinam boa parte de seus esforços para alimentar os cofres públicos, sem a devida correspondência em infraestrutura, saneamento básico, serviços de saúde  e educação. Certo? E mais: as empresas, por exemplo, atuam como verdadeiras entidades a fazer a coleta desses impostos e taxas, sendo exigidas a registrar adequadamente e seguir fielmente as regras complicadas para cada um dos tipos e natureza dos itens que compõe a carga tributária nacional.

E qual é a participação do Estado brasileiro (governo federal, governos estaduais e municipais) na atividade empresarial? Afinal, é o Estado brasileiro um sócio importante nos negócios? Não resta dúvida que sim, os empresários têm aqui sócios bem relevantes.

Acredito que vale registrar, com alguns números, o impacto da carga tributária na atividade empresarial, e para tanto colhi informações publicadas no site da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) de algumas empresas de capital aberto de diferentes setores, a partir do demonstrativo de valor adicionado.

Essa peça contábil força a direção do olhar para quanto do valor gerado pela empresa e/ou grupo econômico foi destinado a despesas com as pessoas, valores registrados como pertencentes a governos, o que foi gasto com partes terceiras – financiadores da atividade empresarial, como bancos, e, finalmente, o montante que foi destinado à remuneração de sócios e acionistas.

R$ Milhões ULTRAPAR AMBEV EMBRAER RENNER LOCALIZA RANDON
RECEITA
79861 69655 21635 8246 4514 3278
% % % % % %
VALOR 6390 100% 42808 100% 5733 100% 3952 100% 1818 100% 1298 100%

PESSOAS

1771 27,7% 3682 8,6% 3557 62,0% 853 21,6% 455 25,0% 505 38,9%
GOVERNOS 1574 24,6% 21384 50,0% 629 11,0% 1903 48,2% 350 19,3% 408 31,4%
ACIONISTAS 1571 24,6% 13083 30,6% 585 10,2% 625 15,8% 409 22,5% -11 -0,8%
OUTROS 3OS 1474 23,1% 4659 10,9% 962 16,8% 571 14,8% 604 33,2% 396 30,5%

Note que dessas seis empresas/grupos selecionados, o valor atribuído ao governo (impostos e taxas) ficou entre o primeiro (no caso da Ambev com 50% e Renner com 48,2%) e o segundo maior destino de recursos (valor) no grupo Ultrapar (24,6%) e Randon (31,4%).

A representatividade do valor distribuído ao governo é menor no caso da Embraer, pois a empresa é focada na exportação e tem acordos especiais de impostos incidentes sobre itens importados que adquire no exterior e a Localiza é típica empresa prestadora de serviços onde o impacto de ISS é de fato relevante, mas cuja taxa sabidamente é inferior a outras como as de  ICMS e PIS/Cofins.

Mais dramático: praticamente em todas as empresas, exceto a Localiza, o montante de valor atribuído aos sócios/acionistas proporcionalmente ao total ficou atrás do “sócio” governo.

Sim, os governos são sócios vorazes a consumir recursos gerados nas atividades empresariais, o que ao final do dia impacta a população com repasses desses desembolsos ao preço de produtos e/ou serviços, e por outro lado impactam negativamente a competitividade da companhia.

Essa realidade de alta carga tributária, no caso das empresas, exige muita atenção dos gestores para adequado monitoramento das operações no sentido de não infringência das regras e leis, enquanto buscam alternativas legais e inteligentes para diminuir a excessiva oneração do negócio causada pelo governo “guloso” e com quase nenhuma capacidade de gestão adequada.

Gestor: faça a lição de casa não se descuidando do correto registro e apuração dos impostos, além de seu pagamento, mas também dedique boa parte do esforço ao planejamento tributário inteligente.

Bons negócios!

 

Revisão de texto: Virgínia De Biase Vicari

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