“The challenge for all people of ambition is to recognize that the pursuit of success creates constant temptations to sacrifice integrity and, that there is a point at which the price of success makes its fulfillment worthless”
Michael Josephson
Há um livro muito interessante cuja versão da língua portuguesa foi lançada tem dez anos, mas que não perde atualidade ao tratar de questões relacionadas à ética das lideranças. O título: “Uma questão de caráter”.
O que torna este livro único em sua abordagem é o fato de que o autor – Joseph L. Badaracco – graduado, pós graduado e doutor por Harvard, na qual leciona “Ética nos Negócios”, estimula a discussão trazendo à luz conteúdo e contextos extraídos de obras literárias clássicas de Sófocles, Scott Fitzgerald e Arthur Miller, por exemplo.
Pois bem…neste livro encontrei um capítulo específico merecedor de reflexão e que pode ajudar líderes de negócio avaliar comportamentos desenvolvendo capacidades, e habilidades para algo que de fato não é negociável: a ética!!!
O professor Badaracco destaca o capítulo 7, sob o sugestivo título de: “Como combino princípios e pragmatismo?”. O texto gira em torno de uma obra do inglês Roberto Bolt, já falecido, que escreveu em 1954 “A man for all seasons”. Esta obra teve versão em cinema cujo título em português é: “O homem que não vendeu sua alma”, e que mereceu Oscar em 1966. Precisa dizer mais?
A história, talvez com pitadas de imaginação, trata da vida real de Thomas More, que muitos de nós conhece como Thomas Morus autor consagrado de obras como “Utopia”. Quem já não ouviu falar dele?
Thomas More viveu no Reino Unido entre os séculos XV e XVI. Ele foi filósofo, homem de estado, diplomata, escritor, advogado e ocupou vários cargos públicos, tendo sido promovido pelo Rei Henrique VIII a “Lord Chancellor” e é justamente a partir deste novo desafio que a vida dele muda resultando em sua condenação e decapitação no ano de 1535.
Sim! Algo de muito sério ocorreu com Thomas More, a partir de seu comportamento, criando uma situação insustentável junto ao Rei culminando portanto em sua condenação como dito acima.
Quando falamos de líderes no mundo dos negócios há grande apelo para que estes sejam vistos, e sobretudo provados, como acima de qualquer suspeita na condução do empreendimento. Sem dúvida se espera sempre comportamento ético, e para tal estes líderes devem ter bons princípios e sobretudo praticá-los. Mas…nem sempre é assim, certo?
Badaracco argumenta que o desafio dos líderes, hoje e sempre, será como equilibrar princípios com pragmatismo, afinal os homens e mulheres em posição de comando são exigidos a entregar resultados e não para serem “beatificados”. É…ele tem um bocado de razão…
Como é possível conciliar princípios e pragmatismo uma vez que o perfil do (a) líder, em boa parte das vezes, é visto como daquela pessoa que em casa é honesta e cheia de princípios, mas no trabalho deveria atuar como “duro” e insensível. É isto mesmo?
O próprio professor Badaracco cita Maquiavel…será que serve de fato de referência no mundo empresarial? De todo modo Maquiavel dizia existir uma regra para a vida privada e outra para os negócios..Uhummmm….
E como a história e experiência de Thomas More, retratada em “O homem que não vendeu sua alma”, pode ajudar ao líder equilibrar princípios com pragmatismo?
Thomas More, homem profundamente religioso, lúcido, educado e estudado se viu diante de uma situação muito complicada. E qual foi ela? Diz a história que Henrique VIII pretendia obter o divórcio de sua esposa Catarina de Aragão, que era estéril, a fim de ter um filho e sucessor com Ana Bolena, sua amante.
Estando Thomas More no posto de “Lord Chancellor” e com ótimo relacionamento com a Igreja foi “solicitado” a ajudar o Rei em seu feito permitindo que este se auto proclamasse divorciado o que só poderia ser validado pelo Papa. Bem…complicado, não é?
Quem como líder já não se viu diante de uma situação em que uma decisão conflita com seus princípios? Não é? Como poderia Thomas More, homem de fé, encaminhar com sucesso esta missão? Aliás a pergunta é: aceitaria ele a tal missão, passando por detrás da decisão papal?
Como Thomas More foi decapitado, por decisão do Rei Henrique VIII, a resposta é fácil, não é? Ele não aceitou a missão de permitir ao rei o “auto divórcio”, mas não disse isso a ele diretamente. Simplesmente seu comportamento claramente demonstrou sua negativa e aí restou ao rei condená-lo.
Thomas More era muito hábil e sabia como poucos exercer sua liderança provocando as pessoas buscarem no seu interior resposta para os comportamentos desejados, segundo a narrativa histórica.
Aqui listo alguns pontos sobre o “jeitão” de Thomas More que por certo podem servir para líderes no exercício de suas atribuições fazendo as coisas acontecerem sem abrir mão de princípios e ética:
- a sabedoria está em se abster de ameaças verbais e/ou insultos;
- é preciso prudência significando conhecer a natureza dos inconvenientes e adotar o menos prejudicial como sendo bom;
- o uso de humor, mesmo em situações “sisudas” pode ser boa saída. Diz Badaracco que com jeito delicado, amistoso é possível ao líder “cutucar” pessoas de mente firme, se a elas o líder pretende manter no entorno;
- em algumas oportunidades é preciso “dramatizar” para que o outro, ou a outra, se aperceba melhor da situação instalada;
- a sinceridade e a verdade pessoais, para More, não garantem que declarações de princípios vençam num ambiente de grande desafio e ameaças. Para comunicar eficazmente o líder deve “personalizar” a mensagem considerando também o perfil do interlocutor;
- não há inconveniente em o líder pedir compreensão, embora alguns possam julgar tal comportamento sinal de fraqueza, mas ao contrário pode estimular a outra parte a lutar;
- a mente humana é um emaranhado, então não é possível acreditar que as pessoas serão convencidas só pelo discurso direto devendo o líder conduzir o processo passo a passo começando por uma “cutucada” e aumentado de intensidade.
Finalmente para refletir: ao invés de o líder impor a mudança que tal fazer com que a outra parte a aceite depois de fazer sua própria reflexão?
Foi encaminhando os desafios à sua frente com estas características de ação que Thomas More foi bem sucedido ao longo de sua vida, porém chegou a um ponto em que os princípios falaram mais forte do que o pragmatismo.
Pense nisso!